segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Música que lhe beija a boca


Era uma noite anormal de verão. Anormal porque não chovia, mas estava bastante quente e sensual.
Uma noite de verão sensual é aquela que você debruça na janela do seu quarto, solitária, e pensa assim ‘essa noite está convidando para entregar-me a ela’.
E então, com esse desejo jogado no universo, o telefone tocou.
Era o convite da noite. O convite que faltava para espalhar pelo quarto, roupas diversas, maquiagens, secador de cabelo ligado, sapatinhos, colares, brincos, anéis e tudo o que uma mulher precisa para ficar arrumada.
Ela se emperiquitou toda. E se sentia especialmente bonita, apesar de ter acordado com a péssima descoberta de que, seu recente ex-marido, já se exibia com outra por todos os lados da cidade.
Mesmo assim, ela se sentia especialmente bonita.
A campainha tocou. Ela desceu saltitante, aquelas escadas do velho prédio onde morava.
Então, um belo garoto a esperava. Garoto o qual ela já havia experimentado o sabor dos lábios. Mas sem muita pretensão, (até por tamanha tristeza sentida pela manhã), ela entrou em seu carro e partiu.
Chegando ao local, um barzinho de música românica, encontraram-se com outros amigos. Conversaram, riram, dançaram, cantaram (aquelas músicas cheias de dor de cotovelo) e beberam. Ela bebeu tequila, misturando-a com toda cerveja bebida antes.
Era o passo inicial de uma grande noite. A noite mais exótica da vida dela.
O momento de ir embora chegou rapidamente, (pelo menos era assim que ela se lembrava), e ele a conduziu até o carro.
O trajeto até a casa foi pouco percebido por ela, que ao abrir os olhos e avistar a portaria do prédio o olhou e disse:

-Mas eu não quero dormir...

Ele, um cavalheiro, a convidou então para uma volta pela cidade. Ela mais do que de pressa aceitou.
Ao pararem no primeiro semáforo eles se olharam. Ela colocou docemente a mão em sua nuca e os olhares continuaram fixos um no outro. Ele, delicadamente, desceu do volante sua mão direita, até a perna esquerda dela.
Foi aí que ela notou que para esse momento havia uma trilha sonora. Enquanto ele dirigia o carro, (sempre com a mão na perna dela), cantava de maneira tão bonita, acompanhando a música que tocava.
Uma música até então desconhecida por ela. Uma música que ela, (somente ela nesse momento), o ouvia cantar, com tanto charme.
E ela o olhava com tanto apreço, com tanta admiração, que nem a tequila lhe tirou da lembrança, aquele momento, do garoto charmoso, cantando enquanto acompanhava aquela música deliciosa.
O carro parou. A tequila começava a atrapalhar um pouco a lembrança do primeiro beijo da noite.
Mas o beijo aconteceu. E eles se entregaram ao beijo com tamanho desejo, que já não se viam mais em um espaço físico público, como a rua.
Não, eles não eram apaixonados um pelo outro, mas o beijo era apaixonante. Um beijo que envolvia boca, bochecha, pescoço, mãos, peles, corpos colados, cabelos, braços, abraços, olhares...
Um beijo com entrega! Sem pudor e sem rédeas. Um beijo sem tempo para acabar, eloquente, quente. Mais íntimo do que dois corpos nus, numa cama qualquer.
Um beijo com trilha sonora, que por tempo demais não saiu da lembrança dela.
Uma música, que agora é mais que melodia, letra e canção.
Uma música que não só lhe toca o ouvido, como também lhe beija a boca.

A noite acabou cedo. As noites, os dias, sempre acabam. Mas o beijo...

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